Ronnie Lessa, preso pela morte de Marielle Franco, é indiciado por tráfico internacional de armas

Acusado de matar Marielle começou a ser investigado após armas serem encontradas em sua casa em março de 2019 — Foto: Reprodução/JN

Por Leslie Leitão e Henrique Coelho, G1 Rio — A Delegacia Especializada em Armas, Munições e Explosivos (Desarme) indiciou por tráfico internacional de armas o PM reformado Ronnie Lessa — preso e acusado pelos homicídios de Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes.

Segundo o delegado Marcus Amim, titular da delegacia, Ronnie traficava armas dos Estados Unidos desde 2014 com a ajuda da filha. Mohana Figueiredo morava nos EUA e também foi indiciada. “Até pouco tempo antes de ser preso, ele estava praticando essa atividade”, explicou Amim.

Com a apreensão de telefones celulares no dia da prisão de Lessa, a Delegacia de Homicídios (DH) e Ministério Público começaram a analisar conversas e arquivos. Os relatórios foram enviados para a Desarme, que instaurou um novo inquérito para apurar o tráfico internacional de armas.

De acordo com os investigadores, peças e acessórios eram adquiridos em sites de venda de armas e em países como China, Nova Zelândia e Estados Unidos. De lá, eram mandados para o Rio de Janeiro.

Filho menor de idade investigado

A investigação ainda encontrou indícios de que um dos filhos de Lessa, menor de idade, tirou fotos com armas reais. Por isso, segundo Amim, parte da investigação foi enviada para a Vara de Infância e Juventude.

“Tem algumas fotos que ele ostenta o que a gente crê que sejam armas de fogo de verdade. Por isso, ele já é passível de receber medidas socioeducativas”, explicou o delegado.

Diálogos no WhatsApp

Uma conversa de 13 de agosto de 2018, pelo Whastapp, chamou a atenção dos analistas. No trecho, Mohana envia ao pai a foto de uma peça de fuzil.

Na troca de mensagens, a Desarme encontrou ainda uma orientação de Lessa à filha. “Escreve ‘metal parts’ [peças de metal]”. A polícia acredita que essa descrição do que estava sendo mandado para o Brasil era uma forma de burlar a fiscalização.

“As compras realizadas por meio eletrônico e as mensagens trocadas demonstram que o material era trazido para montagem de armas de fogo no Brasil. Ronnie Lessa adquiria essas peças de armas fora do país e orientava sua filha para que retirasse embalagens e outras identificações, com o intuito de se esquivar de qualquer órgão fiscalizador brasileiro”, detalhou Amim.

Há outros envios feitos por Mohana, que vivia na Geórgia e trabalhava como treinadora de futebol.

“Vou postar hoje. O que escrevo na descrição e valor?”, pergunta a filha. “Rubber parts [peças de borracha]”, responde, Lessa, uma semana mais tarde.
Em 23 de outubro de 2018, Lessa dá orientações mais específicas no intuito de burlar qualquer possível fiscalização: “Não coloca o fone, não. Bota tudo sem nota e embalagem escreve plastic block [placas plásticas]”, diz, completando: “Coloca como valor o preço da taxa de correio”.

Os 117 fuzis incompletos

Na casa de Lessa, foram encontrados 117 fuzis incompletos. O arsenal, segundo a delegacia, era todo falsificado e seria vendido a criminosos.

Lessa, de acordo com as investigações, estudava formas de fabricação de carregadores e digramas de cano para fuzil calibre 5,56., justamente as peças que faltavam nesses fuzis.

O relatório da Desarme destaca ainda as pesquisas realizadas por Ronnie Lessa na internet com a finalidade de adaptar acessórios para melhorar armas — entre elas, a metralhadora MP5.

O policial militar havia pesquisado um filtro de combustível da marca Napa para ser adaptado ao armamento. De acordo com a DH, uma MP5 foi usada para matar Marielle.

Sigilo quebrado

Em março de 2020, a Justiça quebrou o sigilo bancário de Lessa e de Élcio de Queiroz, acusado juntamente com Lessa de participar do homicídio de Marielle e do motorista Anderson Gomes. Somente Lessa, ex-policial reformado, teve bens no valor de R$ 2,6 milhões sequestrados.

Procurada, a defesa de Ronnie Lessa não respondeu até a publicação desta reportagem.