Legislativo discute obrigatoriedade da língua espanhola nas escolas públicas estaduais

Debate teve por objetivo encontrar medidas para manter o Espanhol como matéria obrigatória nas escolas — Foto: Eduardo Maia

A Assembleia Legislativa realizou audiência pública, na tarde desta quarta-feira (10), para discutir o tema “Língua espanhola como disciplina regular na rede estadual de ensino”. De propositura do deputado Coronel Azevedo (PSL), o debate teve por objetivo encontrar medidas para manter o Espanhol como matéria obrigatória nas escolas públicas estaduais.

“O conhecimento de múltiplas línguas estrangeiras é essencial para a boa formação dos estudantes, já que agrega fatores específicos socioculturais e de comunicação concreta. Nesse sentido, o debate de hoje vem ao Legislativo em busca do acesso universalizado da educação básica do Rio Grande do Norte”, justificou o parlamentar.

Debate teve por objetivo encontrar medidas para manter o Espanhol como matéria obrigatória nas escolas — Foto: Eduardo Maia

A professora doutora em língua espanhola e pesquisadora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN), Maria Trinidad Velasco, destacou a relevância da língua hispânica no Brasil e no mundo, através de dados estatísticos, e criticou a retirada da obrigatoriedade da disciplina pela legislação federal, em 2016, na chamada “Reforma do Ensino Médio”.

“A importância do Espanhol para a nossa sociedade reside principalmente na ampla possibilidade de comunicação nos diversos espaços de convivência e trabalho, como indústria, comércio e turismo. O RN tem um potencial turístico gigantesco, com lugares belíssimos. E essa atividade econômica poderia gerar ainda mais renda para o estado, após o aumento do conhecimento da língua espanhola em toda a sociedade potiguar”, defendeu a professora.

Maria Velasco apresentou dados de pesquisa realizada pelo Instituto Cervantes, em 2018, em diversos países, segundo a qual mais de 15 milhões de pessoas atualmente estudam Espanhol no mundo; a segunda maior língua materna do mundo é a espanhola; e ela também é a terceira língua mais usada na internet.

A professora também criticou a recente mudança ocorrida na nossa legislação federal. “Até 2016 a língua hispânica era obrigatória nas escolas públicas e possuía horário regular semanal. Mas, em fevereiro de 2017, uma lei federal tornou o Espanhol uma disciplina optativa, levando muitos professores a serem deslocados de suas funções”.

Ainda segundo Maria Velasco, sequer houve consulta aos educadores. “Não nos deram nenhuma explicação. Simplesmente retiraram a disciplina e pronto. Na época nós procuramos alguns órgãos do Governo Federal para obter explicações, mas não obtivemos resposta até hoje”, lamentou.

Revelando dados da Secretaria de Educação, colhidos de 2013 a abril de 2019, a educadora demonstrou que houve um sensível decréscimo no número de professores de língua espanhola no Estado do RN.

“Em 2016 havia 479 professores de espanhol em todo o RN. Esse número aumentou para 517, em 2017, ano em que foi modificada a lei. Por isso, já em 2018, percebemos uma baixa para 425 professores, chegando a apenas 323 professores de língua espanhola, em todo o estado, agora em 2019. A pergunta que fica é: onde estão os restantes? Provavelmente estão desviados de suas funções, o que significa um prejuízo imenso para a educação do Rio Grande do Norte”, alertou Maria Velasco.

O deputado Francisco do PT também levou sua contribuição ao debate. Segundo ele, a maioria dos turistas que visitam nosso estado são da América do Sul e, consequentemente, falam espanhol. “Por isso há a necessidade da nossa população ter um mínimo de domínio dessa língua, para que possa receber bem os visitantes e aproveitar as oportunidades de trabalho”, disse.

Ainda segundo o parlamentar, “essa discussão é importante não só do ponto de vista da economia e da geopolítica, mas da parte da integração de todo um continente, que é cada vez mais necessária no mundo globalizado”.

Ao final do seu discurso, Francisco do PT sugeriu a criação de uma comissão para ir até a governadora Fátima Bezerra (PT) e dialogar sobre a importância de se ter a língua hispânica na grade curricular da rede pública de ensino.

A professora doutora do Departamento de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Marta Gonçalves, pediu a ajuda de todos os presentes na luta pela implantação de uma política linguística que realmente preserve os interesses da população. “Quando falo em política linguística, eu quero dizer que a lei existe, mas ainda precisa ser efetivada. Qual é o sentido da pessoa entrar na faculdade e se formar professor, se não sabe se vai ter emprego futuramente?”, destacou.

O Pró-Reitor de Ensino do IFRN, Agamenon Tavares, descreveu-se feliz por saber que existem pessoas lutando por uma educação melhor no estado, mas ao mesmo tempo revelou-se triste, por não ter havido qualquer diálogo com profissionais de educação à época da elaboração da anteriormente citada Reforma do Ensino Médio.

“O IFRN se opõe veementemente a essa reforma. Nós mantivemos as disciplinas que foram retiradas pela lei, porque entendemos que a dimensão humana é tão importante quanto a formação profissional. Além disso, nós não acreditamos em hierarquia de saberes”, disse o Pró-Reitor.

Ele disse ainda que os professores precisam ser mais reconhecidos, as escolas precisam ter mais estrutura, recursos, espaços esportivos e outros incentivos a uma educação de qualidade.

Representando a Secretaria Estadual de Educação, Amilka Lima também comentou sobre a reforma e seus impactos no ensino do RN.

“A lei de 2016 até o momento não produziu nenhuma alteração na grade curricular do nosso estado. A língua espanhola, portanto, não está excluída do processo de ensino da rede estadual. Estamos, sim, num momento de transição e formação da base curricular do ensino médio, mas a secretaria reconhece a importância da língua espanhola como elemento formativo educacional e sociocultural dos alunos”, esclareceu.

Amilka Lima garantiu que a secretaria é sensível às demandas da sociedade potiguar e, inclusive, aguarda contribuições da sociedade civil articulada para a elaboração da nova base curricular, frisando que “em nenhum momento ficou decidido que o espanhol seria excluído da grade estadual de ensino”. “Inclusive, no último concurso para professor efetivo da rede pública, foram convocados docentes de língua espanhola”, exemplificou.

Como encaminhamento da audiência, ficou decidido que seria formado um grupo de trabalho, composto pelos deputados Coronel Azevedo e Francisco do PT, além de representantes de entidades ligadas ao tema, para marcar uma audiência junto à governadora – e professora – Fátima Bezerra.

O objetivo do encontro, segundo Coronel Azevedo, é “defender a permanência do Espanhol como disciplina obrigatória nas escolas estaduais de ensino médio, permitindo um futuro melhor para alunos e professores da área, além de um maior aproveitamento do potencial turístico do estado”.