Por g1 PB — A prisão da vereadora Raíssa Lacerda (PSB) nesta quinta-feira (19) ocorreu no âmbito da Operação Território Livre, conduzida pela Polícia Federal. Neste mês de setembro, duas fases da operação foram deflagradas em João Pessoa, resultando no cumprimento de vários mandados de busca e apreensão, na prisão de outras três mulheres e na expedição de um pedido de prisão preventiva contra um apenado.
A operação visa combater o crime de aliciamento violento de eleitores. Candidata à reeleição, Raíssa Lacerda é suspeita de integrar um esquema que utiliza meios ilegais para coagir moradores de determinados bairros a votarem nela.
O g1 reuniu informações sobre a operação, incluindo o que está sendo investigado e quem são os alvos.
A operação é batizada de “Território Livre” em referência à liberdade que os eleitores devem ter de ir e vir e também de exercer o seu voto. No dia 10 de setembro, uma primeira etapa da operação já tinha sido realizad. Naquele dia, três mandados de busca e apreensão foram cumpridos.
Raíssa já era alvo da operação, e um dos mandados de busca aconteceu na residência da vereadora. No local, foram apreendidos um aparelho celular e dinheiro em espécie. Ela alegou à época que era vítima de perseguição.
Durante a segunda fase da operação, deflagrada nesta quinta-feira (19), foram cumpridos também sete mandados de busca e apreensão em diferentes bairros da cidade. Policiais federais compareceram ao centro comunitário Ateliê da Vida, localizado no São José, que foi um dos alvos dos mandados. Documentos foram levados do local para auxiliar nas investigações e para servir como provas eventuais.
Raíssa Lacerda foi presa suspeita de integrar um esquema que se utilizava de violência e de outros meios ilegais para tentar obrigar que pessoas de determinados bairros votassem nela. Além de Raíssa, outras três pessoas mulheres foram presas. Um apenado, inetgrante de uma facção , que está preso, foi alvo de novo mandado, e um sexto suspeito com mandado de prisão ainda está sendo procurado.
Sobre a operação, a Procuradoria-Geral da Câmara Municipal de João Pessoa informou, por meio de nota, que “vem acompanhando de perto os desdobramentos da Operação Território Livre” e que “confia no trabalho da Justiça e no devido processo legal”.
Aliciamento de eleitor é a prática adotada por candidato, partido ou correligionário que consiste na tentativa de convencer o eleitor, utilizando-se de meios ilegais, a votar em candidato ou partido diferente daquele em que naturalmente votaria, não fosse a ação de convencimento.
O aliciamento é crime eleitoral, e é punível com detenção de seis meses a um ano, com a alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período, e multa no valor de cinco mil a 15 mil UFIRs.
A vereadora Raíssa Lacerda, Pollyanna Santos, Taciana Nascimento e Kaline Rodrigues foram presas no dia 19 de setembro, durante a segunda fase da Operação Território Livre. A prisão aconteceu dois dias antes da proibição de prisão estabelecida pelo Tribunal Superior Eleitor (TSE) durante o período eleitoral.
Pollyanna Santos, Taciana Nascimento, Kaline Rodrigues e a vereadora Raíssa Lacerda foram encaminhadas para a Penitenciária Júlia Maranhão em João Pessoa. A audiência de custódia aconteceu no Fórum Criminal da capital.
Filiada ao Partido Socialista Brasileiro (PSB), Raíssa é atualmente candidata à reeleição. Ela assumiu a titularidade da vaga deixada pelo vereador Professor Gabriel, que faleceu no fim de maio, devido a complicações decorrentes de um acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico.
Antes disso, Raíssa foi secretária-executiva de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de João Pessoa.
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Na Câmara Municipal de João Pessoa, sua atuação começou em 2008, quando foi eleita vereadora. Durante seu primeiro mandato, foi eleita presidente do diretório municipal do Partido Social Democrático (PSD), seu partido na época.
A parlamentar vem de uma família com tradição política. Ela é filha de José Lacerda Neto, ex-prefeito, ex-vice-governador e ex-secretário de Articulação Política. No poder estadual, ele teve seu mandado cassado pelo TSE em 2008 por abuso de poder econômico e político, e conduta vedada a agente público nas eleições de 2006, quando atuava com o então governador Cássio Cunha Lima.
De acordo com o Sagres, do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba (TCE-PB), Kaline Neres do Nascimento Rodrigues é comissionada da Prefeitura de Municipal de João Pessoa, lotada na Emlur com o cargo de encarregada de turma. Ela foi admitida em 1º de julho de 2022.
As investigações da Polícia Federal apontam que a suspeita articulava com líder de facção criminosa para conseguir votos para a vereadora Raíssa Lacerda no bairro Alto do Mateus, em João Pessoa.
Na primeira fase da Operação Território Livre foram apreendidos o celular de Raíssa e mais de R$ 36 mil em dinheiro.
Ao analisar o celular da vereadora, a Polícia Federal encontrou uma conversa de Kaline Rodrigues com David Sena de Oliveira, apelidado de ‘Cabeça’. O homem é citado pela PF como o “gerente do tráfico” no bairro Alto do Mateus, responsável pelo tráfico de entorpecentes na região. Segundo a PF, Kaline enviou as conversas para a vereadora como forma de “prestação de contas”.
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Em um áudio, Kaline pede que o traficante apoie a candidatura de Raíssa Lacerda e que o homem impeça a campanha de outra candidata a vereadora na região.
Kaline Rodrigues explica para o chefe do tráfico que Raíssa Lacerda precisa de votos e que Raíssa deve conversar com o traficante em breve. A funcionária pública também promete conseguir carros alugados pelo município para o pai do traficante e cargos públicos.
A Polícia Federal afirma que a conversa tem como objetivo beneficiar Raíssa Lacerda através do controle de território no Alto do Mateus e coação para o voto. Ainda segundo a PF, o controle territorial do traficante é reafirmado e colocado à disposição de uma campanha eleitoral em troca de facilidade de acesso aos bens públicos.
A investigação também destaca que está claro que Kaline e Raíssa tinham consciência que estavam conversando com um traficante e contavam com seu controle sobre aquele território. David é considerado foragido no âmbitio da operação.
Pollyanna Monteiro Dantas dos Santos é suspeita de pressionar moradores do bairro São José para determinar em quem eles devem votar. A investigada é esposa de Keny Rogeus , conhecido como Poeta, e citado na investigação da PF como líder da facção criminosa que atua no bairro São José, em João Pessoa. O homem está preso na Penitenciária de Segurança Máxima Doutor Romeu Gonçalves de Abrantes, o PB1.
A Polícia Federal identificou um diálogo entre Raíssa Lacerda e a investigada, através da análise do celular da vereadora. De acordo com as investigações, Pollyana exige que Raíssa inclua seu filho na Regulação, que seria uma “forma de pagamento” em troco do apoio de Poeta.
A investigação encontrou um documento da prefeitura que encaminhava o filho da suspeita para trabalhar na Unidade de Pronto Atendimento dos Bancários. Segundo o Portal da Transparência do Município de João Pessoa, em junho de 2024, o filho de Pollyana foi contratado por excepcional interesse público para o local.
Analisando o celular de Pollyana Santos, a PF encontrou imagens em atividades partidárias, vídeos de armas e troca de mensagens com o traficante Poeta. A investigação aponta que ela recebia ordens de preso sobre quem poderia ou não fazer campanha no local e quais candidatos os moradores poderiam fazer manifestação política, além de orientar apenados sobre quais candidatos devem apoiar.
Já Taciana Batista do Nascimento é contratada por excepcional interesse público na Prefeitura de João Pessoa como auxiliar operacional desde 1º de fevereiro de 2023, segundo a plataforma Sagres, do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba (TCE-PB). A investigada era usada para exercer influência na comunidade e é ligada ao centro comunitário Ateliê da Vida.
Taciana Nascimento e Pollyana Santos também trocavam mensagens, que segundo a PF, demonstram o controle da facção criminosa quanto aos votos dos moradores da comunidade.
A assessoria de Raíssa Lacerda informou por meio de nota que acordou perplexa e consternada com a prisão da vereadora e reiterou a inocência dela. “Como dito anteriormente, Raíssa não possui nenhuma ligação com as pessoas que foram citadas no processo da operação ‘Território Livre’ e a verdade virá à tona e será esclarecida”. O g1 tentou contato com a defesa dos demais envolvidos, mas não obteve resposta.
O advogado Felipe Pedrosa, que representa Pollyanna e Taciana, disse que ambas colaboraram com a Justiça e que as prisões preventivas seriam desnecessárias. Na sexta (20), uma nova decisão da Justiça permitiu que Pollyanna ficasse em prisão domicliar
O advogado Emanuel de Alcântara, responsável pela defesa de Kaline, informou que “não tem nenhum material comprobatório que incrimine e nem que caracterize os crimes incrutados a ela”. A defesa comunicou também que entrou com um pedido de habeas corpus.
A defesa de Keny Rogeus preferiu não se manifestar. A defesa de David Sena, que é considerado foragido, não foi localizada.
Na primeira fase da Operação Território Livre, a Prefeitura de João Pessoa informou em nota que nenhum imóvel ou repartição do município foi alvo de busca e apreensão, e que nenhum servidor público municipal nomeado ou contratado está entre os alvos da operação.
A Prefeitura também disse que lamentava “a tentativa de utilização de tais fatos para insinuar o envolvimento de qualquer autoridade do Executivo municipal com eventos dessa natureza”.
Sobre a contratação de duas envolvidas na investigação, a Rede Paraíba de Comunicação solicitou um posicionamento da Prefeitura de João Pessoa, mas a assessoria informou que não vai comentar.