Avança discussão sobre profissionalização da arbitragem no futebol

Mesa:
procuradora do Ministério Público do Trabalho, Priscila Dibi Schvarcz;
coordenador do Grupo de Trabalho, Vicente Costa Pithon Barreto;
ex-árbitro de Futebol, Luís Antônio Silva dos Santos;
ex-árbitro de Futebol e político brasileiro, Evandro Rogério Roman.
Grupo de trabalho criado pela Comissão de Esporte debateu projeto com profissionais de arbitragem e MPT Marcos Oliveira/Agência Senado

Por Agência Senado — O futebol brasileiro movimenta bilhões todos os anos. Só a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), por exemplo, registrou uma receita de mais de R$ 1 bilhão em 2023. Recém-contratado pelo Corinthians, o holandês Memphis Depay receberá cerca de R$ 3 milhões mensais, o maior salário entre os jogadores em atuação no Brasil. Enquanto isso, os árbitros, peças fundamentais da engrenagem do esporte, seguem em situação amadora. A  criação do vínculo de emprego entre árbitros e federações esportivas é prevista em um projeto de lei (PL 864/2019), que foi tema de debate nesta quarta-feira (18) no Senado.

Um grupo de trabalho criado pela Comissão de Esporte (CEsp) começou a debater o projeto do senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB). A ideia é apontar sugestões ao relator da proposta, o senador Romário (PL-RJ), que também preside o colegiado. 

— Quero destacar a necessidade urgente de profissionalizar os árbitros, os únicos ainda que não são profissionais do futebol. É essencial ouvirmos todos os envolvidos, especialmente os árbitros e suas entidades — disse Romário em vídeo exibido durante a reunião.

Na prática, suas regras de trabalho são definidas pela Lei 9.615, de 1998, conhecida como Lei Pelé. Tal lei define os árbitros como trabalhadores autônomos, ou seja, sem vínculos empregatícios formais com federações estaduais ou com a CBF, por exemplo. A Lei Geral do Esporte também prevê que não há subordinação de natureza laboral entre o árbitro e a entidade desportiva que o contrata.

Sem terem remuneração fixa, os árbitros são escalados para cada partida por sorteio, sendo pagos conforme o número de jogos que apitam. Para os debatedores, apesar de fundamentais para o futebol, os árbitros ficam à margem do mercado bilionário. 

Árbitro de futebol há quase 25 anos e representante da Associação de Árbitros de Futebol do Brasil (Abrafut), Anderson Daronco apontou que a profissionalização é uma antiga luta da categoria que pode impactar positivamente no desempenho dentro de campo.

— Em um esporte em que se tem um poder de investimento cada vez maior e em que se tem uma repercussão cada vez maior de todas as nossas decisões, é inadmissível que a arbitragem continue na sua condição amadora. O que a gente está buscando aqui é um entendimento para que o árbitro se faça presente nesse mundo profissionalizado que é o futebol, em toda essa engrenagem. Muitas vezes, alguns não têm condição de ter um preparador físico adequado, de ter um profissional de fisioterapia adequado, de ter um profissional do ramo da psicologia adequado — disse.

Atualmente, os árbitros recebem como autônomos. Para a procuradora do Ministério Público do Trabalho Priscila Dibi Schvarcz é evidente o vínculo empregatício entre os “juízes”, como são popularmente conhecidos, as federações e a CBF. 

— A autonomia permitiria, se fosse um efetivo autônomo, que ele pudesse estabelecer as regras daquele jogo, que ele pudesse determinar o horário, o início, o fim, quanto tempo aquela partida vai durar. A autonomia é tudo o que não existe na profissão de árbitro de futebol. A gente está falando de uma categoria de trabalhadores que hoje não tem previsibilidade de remuneração. É uma categoria, hoje, que está à margem da legislação — afirmou.

Filho de Dalmo Bozzano, ex-árbitro de futebol, o advogado Rafael Bozzano destacou que muitos árbitros precisam equilibrar a atividade com outra profissão.

— Para aquele jogo de final de semana, às vezes pode ser que tenha um árbitro que não está naquela sintonia porque ele tem que desempenhar uma profissão de advogado, de dentista, de corretor de imóveis durante a semana. E lá no sábado ele vai parar, vai pensar: “Agora eu tenho que apitar esse jogo aqui.”. Falta o reconhecimento, seja por meio do trabalhador avulso, seja de uma outra figura — defendeu.

Ex-árbitro de futebol e ex-deputado federal, Evandro Rogério Roman apontou que a profissionalização é um desafio que aumenta com a regulamentação das apostas esportivas de quota fixa, as chamadas bets.

— A movimentação financeira que vai passar a ter, a partir de 1º de janeiro, com essas apostas esportivas, é um divisor de águas, de se dizer o seguinte: Olha, gente, ou remunere melhor os árbitros, ou trabalhe melhor com eles, deem a eles uma condição profissional, ou estaremos aqui discutindo mais uma CPI de escândalos — apontou. 

De acordo com o coordenador do grupo, o consultor legislativo Vicente Pithon, uma das ideias é estudar os modelos adotados na profissionalização em outros países.

— A gente tem jogadores, treinadores, preparadores, médicos, jornalistas, agora dirigentes cada vez mais profissionais. E os árbitros como ficam nessa equação? Não é uma questão fácil. Eu acho que a gente tem que enfrentar questões do direito do trabalho, questões relacionadas à própria regulamentação das profissões, questões práticas como remuneração e estabelecimento de vínculos formais de trabalho — acrescentou.