Delegados pedem autonomia da Polícia Judiciária para superar sucateamento

Evento teve o objetivo de discutir e traçar metas no âmbito da segurança pública (Foto: José Aldenir / Agora RN)

Delegados de todas as partes do Brasil se reuniram em Touros, desde a última quinta-feira, dia 29, até o domingo, dia 2, para debater a reforma do sistema de Segurança Pública. Ao final das discussões, os delegados emitiram uma carta com uma série de medidas que eles esperam que sejam cumpridas para melhorar as atuações das policias judiciárias. Dentre elas, a garantia da autonomia financeira e administrativa da Polícia Judiciária.

De acordo com os delegados, a medida serviria para superar o sucateamento da polícia “e em respeito ao fato de se tratar de órgão de Estado, e não de governo, e ser uma das instituições públicas mais fiscalizadas, notadamente pelo controle interno, externo, judicial e popular”.

Foi entendido pelos membros do debate, que uma incrementação na parceria entre as Policias Civis e Polícia Federal também é garantia de que as investigações tenham maior eficácia, “porquanto possuem a mesma missão constitucional e o mesmo desiderato de garantir direitos fundamentais por meio da investigação criminal”.

A lista de melhorias, que ainda pede que policiais sejam impedidos de lotar o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (GAECO) do Ministério Público, contém 22 pontos. Confira na íntegra:

CARTA DO RIO GRANDE DO NORTE.

Os Delegados de Polícia Civil e Federal, reunidos nos dias 29 de novembro a 2 de dezembro de 2018 em Touros/RN, por ocasião do o I Congresso Jurídico da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Judiciária;

Considerando as exitosas discussões promovidas por diversas autoridades e professores presentes no evento, e levando em conta as modernas concepções teóricas e práticas sobre o Sistema de Segurança Pública e de Justiça Criminal e o Papel das Polícias Judiciárias;

Deliberam pela busca imediata das seguintes medidas, que atendem não apenas o legítimo anseio dos Delegados de Polícia de todo o Brasil, mas principalmente a justa expectativa da população brasileira:

1. Reconhecer a pertinência do modelo de segurança pública do Brasil, que atribui as funções de prevenção e investigação a Polícias distintas, e aloca na Polícia Judiciária (órgão imparcial) uma carreira jurídica com poder cautelar para tomada de decisões sobre direitos fundamentais (Delegado de Polícia), permitindo o controle de legalidade imediato dos atos da Polícia Ostensiva e com isso estabelecendo mais garantias ao cidadão, conforme consignado no Plano Orientador Nacional de Planejamento Estratégico das Polícias Judiciárias;

2. Declarar a necessidade de aumentar o investimento na Polícia Investigativa, permitindo o incremento na eficiência da primeira etapa da persecução penal, o que não se dá através da mera mudança do modelo de segurança pública;

3. Constatar que a eficácia da investigação criminal se mede não pela taxa de indiciamento, acusação ou condenação, mas pela descoberta da verdade, tendo em conta que o inquérito policial tem como finalidade principal preservar os direitos fundamentais e servir como filtro contra acusações infundadas;

4. Afirmar a independência funcional do Delegado de Polícia, que como integrante de carreira jurídica e primeiro garantidor dos direitos fundamentais do cidadão, deve tomar decisões segundo seu livre convencimento motivado, abrangendo decisões acerca da prisão em flagrante, indiciamento, princípio da insignificância, justificantes e exculpantes, dentre outras análises técnico-jurídicas, não respondendo por ilícito pelo tão só fato de deliberar fundamentadamente;

5. Respeitar o princípio do delegado natural, direito fundamental do cidadão de ser investigado apenas pela autoridade naturalmente designada pelo ordenamento jurídico;

6. Garantir a inamovibilidade do Delegado de Polícia, tendo em vista que sua remoção somente pode ocorrer através de ato fundamentado de órgão colegiado superior por interesse público, que indique concretamente as circunstâncias fáticas justificadoras, não sendo suficientes ilações, meras referências a dispositivos legais, utilização de termos genéricos ou motivados por ingerência política;

7. Garantir a autonomia administrativa e financeira da Polícia Judiciária, como forma de superar seu sucateamento e em respeito ao fato de se tratar de órgão de Estado, e não de governo, e ser uma das instituições públicas mais fiscalizadas, notadamente pelo controle interno, externo, judicial e popular;

8. Apoiar a instauração pelo Delegado de Polícia de procedimentos para apuração de improbidade administrativa decorrente de práticas criminosas;

9. Incrementar a parceria entre Polícias Civis e Polícia Federal, com apoio a investigações conjuntas, porquanto possuem a mesma missão constitucional e o mesmo desiderato de garantir direitos fundamentais por meio da investigação criminal;

10. Estabelecer eleições por Delegados de Polícia para Delegado Geral mediante lista tríplice com caráter impositivo;

11. Avançar com a ampliação do poder cautelar do Delegado de Polícia, para abranger também a decretação de medidas protetivas de urgência, em defesa da mulher vítima de violência doméstica e familiar, bem como a ampliação da concessão de medidas cautelares diversas da prisão, em especial a fiança;

12. Aperfeiçoar a capacidade postulatória do Delegado de Polícia, para abranger, diante o indeferimento judicial de medidas cautelares, a solicitação de reexame da representação do Delegado e o recurso subsidiário face à inércia do Ministério Público;

13. Fomentar a atuação acadêmica e doutrinária dos professores Delegados de Polícia;

14. Obedecer a divisão de atribuições, cessando a investigação de crimes comuns por Polícia Ostensiva, notadamente pela Polícia Militar e Polícia Rodoviária Federal, que não podem lavrar termo circunstanciado de ocorrência;

15. Reconhecer a inconstitucionalidade e inconvencionalidade da ampliação do conceito de crime militar promovida pela Lei 13.491/17, e obedecer a separação de funções, extinguindo a investigação de crime doloso contra a vida praticado por miliciano contra civil pela Polícia Militar, crime comum que em nada foi afetado pela referida alteração legislativa;

16. Limitar a atuação da P2 da PM, que não pode fazer investigação de crime comum;

17. Impedir a lotação de policiais no GAECO do Ministério Público;

18. Respeitar os limites ao poder requisitório do Ministério Público, porquanto a instauração de investigação depende da indicação fundamentada de indícios mínimos de infração penal, e as diligências adicionais devem ser imprescindíveis e indicadas somente no final do inquérito, por meio de requisição formulada apenas pelo promotor natural;

19. Acatar os limites ao controle externo da atividade policial pelo Ministério Público, pois incide somente sobre a atividade-fim da Polícia Judiciária e não sobre as atividades-meio, por meio de requisição formulada apenas pelo promotor natural;

20. Retirar todos os presos custodiados nas delegacias de polícia;

21. Reconhecer que o inquérito policial qualifica-se como indispensável filtro contra acusações infundadas, verdadeiro instrumento de preservação de direitos e mecanismo de produção de elementos informativos e probatórios;

22. Afirmar a isonomia do cargo de Delegado de Polícia, que deve gozar de todas as prerrogativas das demais carreiras jurídicas.