[OPINIÃO] Cena Urbana / No deserto, por Vicente Serejo

Vicente Serejo - Divulgação
Do Novo Jornal – Não cabe, Senhor Redator, esconder com trapos mornos a pobreza da nossa bancada federal nesses últimos anos só porque não se faz uma democracia sem parlamentares. Sim, não se faz. Mas também é impossível fazê-la quando o desempenho é abaixo de todas as expectativas. Nunca neste Rio Grande sem sorte, como cantou o poeta Bosco Lopes, nossa miséria política desceu a infernos tão mesquinhos. Estamos enfrentando, como diria Nelson Rodrigues, uma solidão de três desertos.
Terça-feira, portanto, há poucos dias, escrevi e publiquei um velho resmungo reclamando do desempenho do governo e das bancadas federal e estadual. E apontei como sinais do nosso pobre destino não termos um grande porto marítimo para turismo e carga, como na Paraíba, Pernambuco e Ceará. E registrei, como parâmetro real, a nossa clara ineficiência comparando com esses mesmos estados: somos o único sem águas do S. Francisco e com salários do governo e prefeitura atrasados.
Naquela hora não se sabia das três derrotas de uma só vez para o Ceará que conquistou três hubs para seu aeroporto: Air France, KLM e Gol a partir de maio do ano que vem. Por falta de aviso não foi. Enquanto o noticiário dava conta de uma dura concorrência, o governo e a bancada repetia a mesma e cansada catilinária de quem a imprensa espalha pessimismo, torce contra, tem sempre má vontade. Escapismos muito comuns na busca de mascarar a realidade que aponta sem disfarces.
É bem verdade que nenhuma classe é tão acusada do feio e do pecado como a classe política. E vítima tão perfeita da bajulação. São tantos, em tantos lugares e há tanto tempo que os políticos preferem usá-los como escudos garantindo as aparências. Por sobre os bons pululam os falsos no teatro da política. No palco, as redes sociais se dividem entre silêncios e denúncias, uns docemente patrocinados, outros não. Impossível discernir quem é quem nesse vale de aplausos e de denúncias.
Receber patrocínio é legítimo e nada impede que seja claramente assumido. Elogiar também. Divulgar honraria a transparência dos portais dos poderes e instituições. O que impede seus gestores se é legal, e se não se pode esconder nada que é pago com dinheiro público? É que o Brasil parece mergulhado num clima de desconfiança, banalizando tudo. O elogio e a crítica, se verdadeiros, não descredenciam. A não ser numa sociedade saturada de delações, com a alma coletiva e melancólica.
O jornalismo – e neste caso nenhum tipo de veículo está isento do pecado – há muito que deixou de ser o fiel vigilante da sociedade. A Lava Jato devolveu-lhe essa condição. Mas, quando o faz, toma cara feia. Este colunista já sofreu ameaça velada – tão tola que sequer mereceu um repúdio público – de assessor viciado no seu silêncio complacente. Alguns, cínicos, aceitam o papel de cães de guarda. É por isso que rosnam nas reluzentes soleiras dos poderosos enquanto a verdade corre…
*Retirado do Novo Jornal